A cultura do litígio ainda é predominante no Brasil, mas nos últimos anos o sistema de justiça tem dado passos importantes rumo a soluções mais consensuais. Mediação e conciliação não são apenas mecanismos alternativos — são caminhos legítimos e muitas vezes mais eficazes para resolver conflitos. E nesse cenário, a atuação extrajudicial de juízes, promotores e advogados ganha um novo protagonismo.
Reguladas pelo novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015) e pela Lei da Mediação (Lei nº 13.140/2015), essas práticas buscam reequilibrar as relações sociais sem necessariamente passar pela sentença. Elas exigem das autoridades jurídicas uma postura menos impositiva e mais facilitadora — o que representa uma mudança de paradigma na formação e atuação dos operadores do Direito.
O Papel do Juiz: Garantidor e Facilitador
Apesar da imparcialidade exigida ao julgador, o juiz pode — e deve — estimular a autocomposição sempre que possível. O artigo 3º do CPC determina que o Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos, inclusive no curso do processo.
Na prática, muitos magistrados conduzem audiências de conciliação com escuta ativa, linguagem simples e foco na solução prática. Já na mediação, por se tratar de um processo mais profundo e conduzido por terceiro imparcial capacitado, a participação do juiz tende a ser indireta — muitas vezes encaminhando os autos para os Centros Judiciários de Solução de Conflitos (CEJUSCs).
O Promotor e a Resolução Consensual
No âmbito extrajudicial, o Ministério Público tem papel fundamental na mediação de interesses difusos e coletivos. Seja na área ambiental, do consumidor, da infância ou da saúde, é comum que promotores celebrem termos de ajustamento de conduta (TACs) para resolver conflitos sem judicialização.
Além disso, em questões penais de menor potencial ofensivo, o promotor pode atuar diretamente na proposta de transação penal e acordo de não persecução penal — instrumentos que valorizam a reparação do dano e a responsabilização sem necessidade de sentença condenatória.
O Advogado: Guia e Guardião da Autonomia do Cliente
Na mediação privada ou judicial, o advogado deixa de ser um porta-voz exclusivamente combativo para assumir o papel de orientador estratégico. Cabe a ele proteger os interesses do cliente, mas também incentivar soluções que preservem vínculos e reduzam custos emocionais, econômicos e temporais.
A atuação extrajudicial exige, porém, preparação técnica e mudança de mentalidade: é preciso dominar técnicas de negociação, escuta qualificada e comunicação não violenta. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) já incentiva essa formação multidisciplinar e reconhece o valor da mediação na prática contemporânea da advocacia.
Marcos Soares: “A cultura do acordo não enfraquece o Direito; ela o aproxima da realidade”
Para Marcos Soares, jornalista do Portal do Magistrado e estudioso da justiça consensual, a atuação extrajudicial dos operadores do Direito não é perda de autoridade — é exercício de maturidade institucional. “A cultura do acordo não enfraquece o Direito; ela o aproxima da realidade. Promotor que resolve com TAC, juiz que estimula a escuta e advogado que orienta para a mediação estão todos servindo melhor à sociedade. O Judiciário não pode ser o único palco da justiça”, afirma.
A mediação e a conciliação representam um novo capítulo na justiça brasileira: mais dialógico, resolutivo e acessível. E o sucesso dessa transformação depende de como juízes, promotores e advogados assumem seus papéis não apenas dentro dos tribunais, mas também fora deles — onde muitos conflitos começam e onde muitos também podem terminar.