Assumir a toga é, para muitos, o ápice de uma trajetória intensa de estudos e dedicação ao Direito. No entanto, a realidade da magistratura vai muito além das provas, dos concursos e da sala de audiências. Ao contrário do que se imagina, o cargo de juiz não é apenas um posto de prestígio e autoridade — ele exige preparo emocional, responsabilidade social e uma capacidade contínua de adaptação à complexidade humana e institucional do sistema de Justiça.
A rotina do magistrado é marcada por desafios silenciosos, como a solidão da função, a sobrecarga processual, o peso de decisões que impactam diretamente vidas inteiras e o constante equilíbrio entre imparcialidade e sensibilidade. A formação jurídica, embora essencial, nem sempre prepara para os dilemas éticos, as pressões externas e os limites da atuação judicial em contextos de desigualdade, violência ou inércia do poder público.
No meio do caminho entre a teoria e a realidade, surgem as frustrações que raramente são comentadas em cursos preparatórios. Marcos Soares, jornalista do Portal do Magistrado, ressalta que “muitos juízes recém-empossados se deparam com uma estrutura precária, varas sobrecarregadas, falta de pessoal e uma distância enorme entre o ideal de Justiça construído nos livros e o que é possível realizar na prática. Isso gera um choque de realidade que, se não for administrado com maturidade, pode afetar o desempenho e a saúde mental do magistrado”.
Além disso, a imparcialidade, princípio fundamental da magistratura, não elimina a necessidade de escuta ativa, empatia e responsabilidade social. Decidir com base na lei é obrigatório, mas ignorar o contexto humano pode tornar a Justiça fria e distante. Cada sentença carrega uma história, e o juiz precisa ter consciência de que seu trabalho não se limita a aplicar normas — ele transforma, interfere e muitas vezes define destinos.
Outro ponto sensível é a exposição pública. Em tempos de redes sociais e intensa polarização política, o magistrado passou a ser alvo frequente de críticas, desinformações e ataques. A prudência na comunicação, a conduta fora do expediente e a preservação da imagem institucional tornaram-se aspectos essenciais do dia a dia.
Embora repleta de obstáculos, a carreira na magistratura ainda representa uma das funções mais relevantes no fortalecimento do Estado Democrático de Direito. O que não te contam antes de assumir a toga é que, mais do que técnica jurídica, o juiz precisa cultivar escuta, equilíbrio e coragem para decidir com justiça — mesmo nos cenários mais adversos.