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Direito Espacial: Quem Deve Responder por Crimes Cometidos Fora da Terra?

Com a crescente corrida espacial liderada por governos e empresas privadas, como SpaceX, Blue Origin e Roscosmos, o espaço sideral deixou de ser apenas cenário de ficção científica para se tornar um novo campo de disputas jurídicas. Entre os vários dilemas que surgem está uma pergunta intrigante: quem deve ser responsabilizado por um crime cometido fora da Terra?

O tema é mais atual do que nunca. A expansão das missões espaciais tripuladas, o aumento de turistas espaciais e o desenvolvimento de estações espaciais privadas exigem regras claras sobre jurisdição penal, responsabilidade internacional e aplicação da lei em órbita.

A base normativa para essas questões está no Tratado do Espaço Exterior de 1967, do qual o Brasil é signatário. Esse tratado estabelece que os Estados continuam sendo responsáveis pelos objetos e pessoas que lançam ao espaço, mesmo que a operação seja realizada por uma empresa privada. Assim, se um crime for cometido na Estação Espacial Internacional (ISS), por exemplo, a jurisdição é do país de origem do autor do ato.

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Esse foi o caso da astronauta Anne McClain, acusada de acessar indevidamente a conta bancária de sua ex-esposa enquanto estava a bordo da ISS. O suposto crime, embora não tenha resultado em condenação, foi o primeiro exemplo público de uma investigação criminal envolvendo atos cometidos no espaço — e foi conduzido pelas autoridades dos Estados Unidos, país de origem da astronauta.

O artigo VI do Tratado do Espaço Exterior reforça que os países são internacionalmente responsáveis por suas atividades no espaço, incluindo as de entidades não governamentais. Isso significa que, em caso de omissão, negligência ou falha de fiscalização de uma empresa nacional, o Estado pode ser responsabilizado internacionalmente, inclusive em tribunais como a Corte Internacional de Justiça.

Para o jurista Marcos Soares, editor do Portal do Magistrado, o Direito Espacial precisa se antecipar aos riscos. “Hoje estamos discutindo crimes individuais cometidos por astronautas, mas amanhã poderemos estar diante de questões complexas envolvendo sabotagem, pirataria espacial ou até conflitos armados em órbita. A legislação internacional deve ser atualizada para prevenir a impunidade e garantir um mínimo de ordem jurídica além da Terra”, avalia.

O desafio aumenta com o avanço da colonização lunar e das missões para Marte, que exigirão sistemas jurídicos próprios ou acordos multilaterais mais robustos. Alguns especialistas propõem a criação de um tribunal internacional específico para o espaço, ou ao menos a adoção de cláusulas contratuais padrão nos acordos entre nações e empresas.

Além dos crimes comuns — como roubo, fraude ou violência —, o Direito Espacial também terá que lidar com crimes ambientais cósmicos, como o despejo de lixo espacial, a destruição proposital de satélites ou a contaminação de corpos celestes, o que já é regulado por princípios do direito ambiental internacional aplicados ao espaço.

Enquanto novas normas não são amplamente discutidas e ratificadas, a tendência é que os crimes cometidos fora da Terra continuem sendo julgados de acordo com a nacionalidade do infrator ou com os acordos de cooperação firmados entre os países envolvidos na missão.

No fim das contas, o espaço não está livre da lei — mas o Direito ainda está correndo atrás do foguete.

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