O avanço das relações comerciais digitais trouxe desafios e oportunidades para o Direito Contratual, especialmente no que diz respeito à função social do contrato. Tradicionalmente, o contrato é visto como um acordo entre as partes, baseado na autonomia da vontade e na liberdade de pactuar conforme os interesses de quem o celebra. No entanto, com o crescimento das transações online, de plataformas de e-commerce e de contratos eletrônicos, surge a necessidade de refletir sobre o impacto social das relações comerciais, especialmente quando os consumidores estão expostos a grandes corporações e tecnologias digitais.
A função social do contrato, um princípio que se alinha com a função de justiça e equidade nas relações contratuais, ganha novos contornos nas relações digitais. Com a popularização de contratos de adesão, onde uma das partes impõe as condições para a outra, sem espaço para negociações, o papel do Direito é garantir que essas relações comerciais respeitem a dignidade do consumidor e promovam o equilíbrio entre as partes. A legislação brasileira, através do Código de Defesa do Consumidor (CDC), já se preocupava com a vulnerabilidade do consumidor, mas a digitalização exige uma abordagem mais robusta e moderna.
Marcos Soares, analista jurídico do Portal do Magistrado, observa que “nas relações comerciais digitais, a função social do contrato não deve se limitar à simples formalidade das obrigações, mas sim garantir a proteção efetiva dos direitos dos consumidores, assegurando que a liberdade contratual não seja usada para criar desequilíbrios e injustiças”. Para ele, as plataformas digitais e as empresas de tecnologia devem atuar de forma ética e transparente, sem prejudicar o acesso à informação, a escolha e a autonomia dos consumidores.
A função social do contrato também se reflete na responsabilidade das empresas em relação à segurança digital, proteção de dados pessoais e garantia da privacidade dos usuários. A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) se insere nesse contexto, ao estabelecer normas para o tratamento de dados dos consumidores, impondo obrigações claras para as empresas que operam no ambiente digital, inclusive em contratos que envolvem a coleta e o compartilhamento dessas informações.
Além disso, a crescente utilização de algoritmos, inteligência artificial e sistemas automatizados em plataformas digitais levanta novas questões sobre a transparência dos contratos e a proteção contra práticas abusivas. Em um mundo onde muitas transações são feitas sem interação humana direta, é imprescindível que as cláusulas contratuais sejam claras e compreensíveis, de modo a evitar que os consumidores se vejam compelidos a aceitar termos desvantajosos ou abusivos sem plena consciência de suas implicações.
Portanto, a função social do contrato nas novas relações comerciais digitais passa a ser não apenas uma questão de equilíbrio entre as partes, mas também uma preocupação com a ética digital, a transparência e o respeito aos direitos fundamentais dos consumidores. É essencial que as normas jurídicas acompanhem as inovações tecnológicas para garantir um mercado justo e sustentável.