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A Constitucionalização do Direito Administrativo: Tendências e Implicações Práticas

Nas últimas décadas, o Direito Administrativo brasileiro passou por um processo de constitucionalização que alterou profundamente sua estrutura normativa e funcional. Esse fenômeno, marcado pela prevalência dos princípios constitucionais sobre a atuação da Administração Pública, redefiniu o papel do Estado, ampliou os mecanismos de controle e fortaleceu a proteção aos direitos fundamentais nas relações entre o poder público e os cidadãos.

Para Marcos Soares, do Portal do Magistrado, “a constitucionalização do Direito Administrativo desloca o eixo de análise dos atos administrativos da legalidade estrita para a legitimidade constitucional. Princípios como proporcionalidade, razoabilidade e eficiência tornaram-se instrumentos de controle que ampliam o diálogo entre o Direito Público e a Constituição”.

A Constituição Federal de 1988 inaugurou uma nova fase do Direito Administrativo ao estabelecer princípios expressos no artigo 37, como legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Além disso, consolidou garantias como o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório nos processos administrativos, influenciando diretamente a atuação dos órgãos públicos e a estruturação dos entes federativos.

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Essa nova matriz constitucional também alterou a lógica das políticas públicas, exigindo da Administração uma postura mais responsiva e transparente. A supremacia do interesse público, antes vista de forma verticalizada, passou a ser reequilibrada com a noção de dignidade da pessoa humana e com o controle social das decisões administrativas.

Na prática, a constitucionalização permitiu a ampliação do controle jurisdicional sobre atos discricionários, a vinculação das licitações e contratos a princípios constitucionais e a maior responsabilização do Estado por omissões administrativas. Decisões do Supremo Tribunal Federal, como as que tratam da judicialização de políticas públicas ou da moralidade na nomeação de cargos, demonstram a centralidade da Constituição na interpretação administrativa.

Outra implicação relevante está na adaptação das leis infraconstitucionais. A nova Lei de Licitações (Lei nº 14.133/2021), por exemplo, adota linguagem e princípios que reforçam a governança, a integridade e o controle, refletindo a consolidação de uma Administração Pública constitucionalmente orientada. Da mesma forma, a Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/1992), com suas recentes alterações, passou a exigir dolo para configuração de ilícitos, seguindo o entendimento constitucional garantista.

Esse movimento também impõe desafios à formação dos servidores públicos e à atuação dos gestores. A constitucionalização exige que decisões administrativas sejam justificadas não apenas com base em normas legais, mas também sob a ótica de princípios constitucionais, o que demanda maior preparo técnico e sensibilidade jurídica.

O fortalecimento de instâncias participativas, como audiências públicas, ouvidorias e conselhos de políticas públicas, também reflete a tentativa de aproximar a Administração dos valores democráticos constitucionais. A cultura da transparência e do controle social tornou-se uma exigência normativa, potencializada por legislações como a Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/2011).

A constitucionalização do Direito Administrativo, portanto, não se resume a um movimento teórico. Trata-se de uma transformação que impõe ao Estado a obrigação de atuar em conformidade com os direitos fundamentais, estabelecendo um novo paradigma normativo e prático para a Administração Pública. Nesse cenário, o desafio central permanece: garantir eficiência com legitimidade, autoridade com responsabilidade e gestão pública com respeito ao cidadão.

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