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A Atuação Judicial Frente à Inércia Legislativa: Ativismo ou Omissão Compensatória?

A atuação do Poder Judiciário diante da omissão do Legislativo tem se tornado um dos temas mais controversos do constitucionalismo contemporâneo. Quando o Parlamento se abstém de regulamentar direitos previstos na Constituição, especialmente os de eficácia limitada, os tribunais muitas vezes assumem um papel ativo para suprir esse vácuo normativo. O dilema que se impõe é saber se essa atuação configura ativismo judicial ou uma compensação legítima frente à inércia institucional.

Para Marcos Soares, do Portal do Magistrado, “o Judiciário não pode usurpar a função legislativa, mas tampouco pode se manter omisso diante de violações a direitos fundamentais causadas pela inércia do Parlamento. Em certas situações, a intervenção judicial é a única via para assegurar a efetividade constitucional”.

O Supremo Tribunal Federal tem reconhecido, em diversas ocasiões, a possibilidade de atuação substitutiva do Judiciário quando o Congresso Nacional não cumpre seu dever de legislar. O marco teórico mais conhecido nesse sentido é o da inconstitucionalidade por omissão, previsto no artigo 103, §2º, da Constituição, que autoriza o STF a comunicar o órgão competente para suprir a lacuna legislativa. Em alguns casos, no entanto, a Corte vai além da comunicação formal e determina medidas provisórias de aplicação direta dos direitos afetados.

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Foi assim, por exemplo, na judicialização do direito à saúde, na decisão que permitiu a união estável entre pessoas do mesmo sexo e nas ações que trataram da criminalização da homofobia. Nesses e em outros casos, a ausência de regulamentação legislativa levou a Suprema Corte a adotar decisões com conteúdo normativo, provocando críticas por suposto excesso de jurisdição.

Por outro lado, há quem veja nessas decisões não um ativismo ilegítimo, mas uma atuação compensatória necessária, capaz de concretizar direitos que ficariam inertes sem a atuação judicial. O debate gira, assim, em torno dos limites da função jurisdicional em um Estado Democrático de Direito e da tensão entre o princípio da separação dos poderes e o postulado da efetividade constitucional.

A atuação judicial frente à omissão legislativa encontra respaldo ainda nos princípios da dignidade da pessoa humana, da máxima efetividade e da proteção insuficiente. Quando o Estado se mostra omisso em proteger direitos fundamentais, pode-se reconhecer a responsabilidade institucional do Judiciário em preencher esse espaço, ainda que de modo provisório.

A jurisprudência evolui no sentido de distinguir entre ativismo e protagonismo judicial. O primeiro é associado a uma atuação desmedida e voluntarista; o segundo, à defesa da Constituição e dos direitos fundamentais diante de falhas sistêmicas de outros poderes. Em ambos os casos, a legitimidade da decisão judicial depende da fundamentação, da proporcionalidade e do respeito aos parâmetros constitucionais.

O fenômeno revela, também, uma crise de representatividade e eficiência do Legislativo, que deixa de responder às demandas sociais com a presteza necessária. Nesse cenário, o Judiciário acaba por assumir um papel institucional que, embora não lhe seja originariamente atribuído, se mostra inevitável diante da urgência de proteger direitos.

O desafio está em manter o equilíbrio institucional: garantir a efetividade da Constituição sem que o Judiciário extrapole suas competências. A resposta não está apenas em conter o Judiciário, mas em fortalecer os mecanismos de atuação legislativa e de controle democrático, de modo a reduzir a judicialização excessiva e promover um funcionamento mais harmônico entre os poderes.

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