Com a consolidação do teletrabalho no Brasil após a pandemia da Covid-19, o chamado “direito à desconexão” passou a ganhar relevância no debate jurídico e trabalhista. A possibilidade de trabalhar de forma remota trouxe flexibilidade para empregados e empregadores, mas também criou novos desafios relacionados à jornada de trabalho, à saúde mental e aos limites da disponibilidade do trabalhador.
O direito à desconexão se refere à garantia de que o empregado não seja compelido a responder mensagens, e-mails ou realizar atividades laborais fora de sua jornada regular de trabalho. Trata-se de um princípio ainda não expressamente regulamentado na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), mas que encontra amparo em fundamentos constitucionais, como a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF) e a valorização do trabalho (art. 170, caput, da CF).
A Reforma Trabalhista de 2017 e, mais recentemente, a Medida Provisória nº 1.108/2022 (convertida na Lei nº 14.442/2022), trouxeram avanços na regulamentação do teletrabalho, mas ainda deixaram lacunas quanto aos mecanismos de controle da jornada e à garantia de pausas. Na prática, muitos trabalhadores enfrentam uma jornada dilatada, com cobranças fora do expediente e dificuldades para separar o tempo profissional do tempo pessoal, o que pode configurar violação de direitos trabalhistas e gerar passivos para as empresas.
O Tribunal Superior do Trabalho (TST) já reconheceu, em alguns julgados, a possibilidade de pagamento de horas extras mesmo em regime remoto, desde que comprovada a exigência de trabalho além do horário contratual. A jurisprudência também tem se debruçado sobre os efeitos do assédio tecnológico e a necessidade de preservar o descanso e a intimidade do empregado.
Para o analista jurídico Marcos Soares, do Portal do Magistrado, o direito à desconexão representa uma evolução necessária nas relações de trabalho contemporâneas: “Não basta permitir o teletrabalho; é preciso garantir que ele ocorra dentro de parâmetros saudáveis. O excesso de conectividade gera sobrecarga e afeta diretamente o bem-estar do trabalhador. O Judiciário deve estar atento a essas novas formas de violação de direitos”, afirma.
Com a crescente digitalização das relações laborais, o direito à desconexão se apresenta como um tema central para o futuro do Direito do Trabalho. A tendência é que novas interpretações e, possivelmente, regulamentações legais venham a consolidar essa proteção, buscando equilibrar produtividade e qualidade de vida.